Costa Rica 1991
- stepcesar
- 28 de mar. de 2022
- 8 min de leitura
Atualizado: 30 de mar. de 2022

Escalado para um trabalho na Costa Rica, país da America Central, pelo meu superior que era presidente de uma grande empresa multinacional. O trabalho principal foi realizar uma pesquisa de fazendas com praias que não fossem muito movimentadas e imóveis em geral para investimento, no final do trabalho de pesquisa, teria como sempre, montar um relatório descritivo com fotos e detalhes de cada local visitado.
Cheguei em San José num domingo de abril de 1991, fui direto ao hotel que havia sido reservado pela secretária, abri minha mala e retirei somente os artigos de higiene e a roupa que usaria no dia seguinte segunda-feira que já haveria uma reunião com um “Real Estate” cujo nome era Jorge.
Me deu fome e fui andar pela rua com a finalidade de encontrar algum restaurante e matar quem estava me matando. Andei alguns quarteirões e não encontrei nada naquela andança sem rumo, por fim vi um McDonalds e não tive dúvidas fui comer um “fast food” e já era tardezinha voltei para o hotel para estudar o meu roteiro do dia seguinte e quais assuntos iria tratar com o Sr. Jorge.
No dia seguinte fui ao compromisso com o Sr. Jorge no endereço dele, nos apresentamos e conversamos a respeito dos assuntos que deveríamos cumprir naquela minha estada. Uma das primeiras coisas que Jorge anunciou foi que meu superior havia esquecido seus óculos de sol “Persol” no seu escritório e me entregou para levar de volta para ele.
Depois de nossa conversa decidimos ir ao primeiro compromisso e conversaríamos mais durante a viagem. No caminho paramos para tomar um café num lugar muito interessante e diferente para mim, era um grande galpão com mesas compridas e bancos tais quais as mesas compridos e tudo construído em madeira bruta da mesma forma como aquelas utilizadas em churasqueiras nas casas providas de um bom espaço. No final do galpão havia a cozinha, tudo à vista dos clientes, havia um balcão separando os clientes da cozinha e do caixa que situava-se ao lado direito da cozinha. Fazíamos os pedidos no balcão e os funcionários entregavam em nossas mesas onde estávamos sentados. Nunca esquecerei aquele café da manhã, um local pitoresco, humilde e muito limpo e a comida das melhores, esta é a memória que guardo. Terminamos nossa refeição e partimos para o local que o Jorge queria me mostrar.
Chegamos num local ermo mas muito bonito, a natureza se superava, na entrada havia um portão daqueles comuns em fazendas antigas, em seguida havia uma casa não muito grande e ao lado um curral com algumas vacas, galinhas pelo terreiro e à frente havia uma floresta e após aquela floresta estava o mar, uma espécie de praia particular. Havia um caminho a ser percorrido, como se fosse uma picada no meio do mato, muito bem conservado, como se não houvesse sido tocado antes por sinal, até chegar à praia, ao caminharmos pela picada começou uma chuva de cocos e olhamos para cima, nas árvores havia macacos por toda parte e alguns nos coqueiros atirando côcos em nossa direção mas continuamos, nenhum côco nos atingiu, chegamos à praia e era um lugar fechado por um morro de cada lado, o mar era límpido, quase transparente, naquela parte e não tive dúvidas, tirei minhas roupas com a devida vênia e me atirei no mar num mergulho maravilhoso, voltamos para a casa lá da frente carregando as roupas nas mãos, só usava o shorts de banho que havia levado comigo, e os símios estavam de prontidão a atirar côcos novamente sobre nós. Tomei um banho de água doce, analisei mais detalhes e anotei os tópicos principais para montar o meu relatório mais tarde, junto aos papéis haviam algumas fotos ainda na máquina a serem reveladas, que tiramos no local.
Neste dia à tarde ainda fomos em dois departamentos do governo para levantamentos da parte legal de compra e venda de propriedades para estarmos certos de que as transações poderiam ser feitas com total segurança. Diga-se por razões justas que os departamentos visitados eram bem organizados e os funcionários com os quais tivemos contato foram muito polidos e educados no atendimento e se colocaram à nossa inteira disposição.
No dia seguinte tinhamos novas visitas a fazer, levantei cedo e fui apanhar o “Real Estate” Jorge no seu escritório. Como no dia anterior paramos em outro local para tomarmos café da manhã, e seguimos viagem, o local desta feita era um tanto distante, cerca de duas horas de viagem.
A viagem bem agradável e tranquila na ida. Pois bem, já no local, que era uma fazenda mas sem nenhuma ligação com o mar, tivemos que atravessar uma espécie de rio com braço de mar, num “ferry-Boat” para chegarmos na propriedade. Feito as análises necessárias para montar meu relatório, partimos de volta para a San José.
De volta no “Ferry-Boat” para travessia que levava uns 20 minutos ou meia hora, não sei precisar pois não marquei o tempo.
A travessia daquele rio ou braço de mar já estava chegando ao final, dali já era possível ver claramente as margens do rio e as casas situadas onde chegaríamos do lá de lá, uns cinco minutos, calculei, até atingir a outra margem. Neste instante começou uma gritaria e as luzes das casas às margens e de repente começaram a piscar, apagavam e acendiam muito rapidamente e incessamente, a embarcação balançava como se fosse um enorme pêndulo de um relógio gigante, árvores caiam e nada podíamos fazer a não ser assistir aquele terror que não era um filme e sim uma realidade que nos deixava apavorados a cada segundo e um segundo parecia uma eternidade.
Finalmente o “ferry-boat” atracou, o pessoal do serviço correu para amarrar a barca nos troncos existentes nos flancos e imediatamente os carros iniciaram a saída para pegar a estrada em seguida. Não sabia que poderia ser pior o terror, pois tudo tremia e podíamos ver a olho nu, a terra, o asfalto a se repartir em rachaduras de todo tamanho, terrorismo ao vivo, a ponto de sentirmos que a vida estava se esvaindo.
Vendo aquela situação disse ao Jorge que estava ao lado, branco como cêra, já que tudo poderia acabar a qualquer momento, eu disse a ele, vou sentar o pé (dirigir em alta velocidade) e mandei ver em direção a San José, por sorte havia umas paradas do tremor onde podíamos desviar com mais precisão das rachaduras do asfalto. A viagem não tinha fim, parecia uma viagem em anos luz a algum lugar inusitado e desconhecido mas não perdi minha concentração ao volante e finalmente chegamos ao hotel, desci do carro com minha pasta com os papéis, me despedi e Jorge levou o carro para devolver à locadora.
Entrei no hotel e notei todos em estado de choque e não era pra menos, peguei minha chave e subi para o meu quarto. Ao abri a porta vi a desgraça, o teto do apartamento no qual eu estava caiu cobrindo minha mala que estava no mesmo canto onde a deixei e também toda a cama, somente a entrada do apartamento se salvou, tinha o banheiro a esquerda e a direita havia a geladeira com algumas coisas em cima que eu havia colocado, como exemplo uma garrafa de “White Horse” ainda de pé, fora as que havia acomodado no interior dela.
A minha grande sorte foi está ali vivo e também pela decisão impensada de tirar da mala somente o que ia usar e guardar de volta as roupas usadas e deixar a mala fechada naquele canto, portanto tudo que tinha dentro dela estava incólume.
Daí por diante veio a lucidez, precisava avisar minha família, e meu superior sobre o que estava acontecendo, à época eu não possuia celular e a telefonia como também a luz elétrica foram cortadas, como faria para avisar alguém que eu estava bem até aquele momento?.
Soube depois que nesse ínterim a mãe de um colega de trabalho também assessor do meu superior ligou para minha casa e falou com minha esposa aventando escabrosas possíbilidades sem saber de nem uma notícia a meu respeito, tais como: “será que ele não morreu?” e seguindo de mais elocubrações estapafurdias que poderiam ter ocorrido, deixando minha mulher e meus filhos em polvorosa.
Naquele mesmo dia do acontecimento do abalo sísmico já escurecendo eu ainda tinha um compromisso marcado com um pessoal de “Real Estate” em San José e o encontro seria às 7hrs da noite daquele dia que ainda continuava a balançar com as consequências do grande terremoto, pois como é comum em todo abalo daquelas proporções haver milhares de pequenos outros abalos sísmicos que duram frações de segundos, como se fosse uma espécie de lembrete da grande ocasião.
Fui ao compromisso e o local era no quarto andar de um prédio. Ao iniciar a reunião, sentiamos alguns balanços no compartimento onde estávamose alguns meio fortes, até que veio um bem importante fazendo aquela sala balançar como um barco em mar revolto. Imediatamente me recusei a permanecer na reunião e o encontro foi suspenso sem nada ter sido concluído. Voltei para o hotel.
Já no quarto do hotel, tomei um banho mesmo frio e me vesti somente com a parte de baixo do pijama, a temperatura ao menos ajudava pois não fazia frio. De tão cansado em todos os sentidos, dormi não sei por quanto tempo, pois houve outro abalo forte balançando o meu aposento lembrando novamente uma emcarcação em mar agitado. Pulei da cama me vesti bem depressa e fui para fora do quarto e notei que havia muitas pessoas ali, todas como eu, com muito medo.
Havia pessoas de diferentes países, como Espanha, Venezuela, Colômbia e eu o único brasileiro.
Começamos a conversar como se nos conhecêssemos há muito tempo e conversa vai conversa vem , havia pessoas de diversos países, como comentado anteriormente, mas mesmo assim o bate-papo fluiu e evidentemente o assunto principal foi a situação de medo que nos encontrávamos. Não tive dúvidas e fui buscar a garrafa de Scotch que tinha no quarto e a conversa continuou em ritmo de “White Horse”, sinceramente não lembro exatamente sobre o que conversamos além do terremoto e das apresentações, falamos de nossos países aqui e ali, com a ajuda de um e de outro na tradução de palavras que eventualmente não eram entendidas, tudo sem muita importância e precisão, com pinceladas rápidas pois os tremores menores continuavam e não nos permitiam uma concentração necessária a uma boa conversa, como o velho ditado um “olho no peixe e o outro no gato”.
Já eram umas três horas da manhã e não aguentávamos mais de sono e fomos para os devidos aposentos tentar dormir. No meu caso, nem tirei a roupa, dormi na hora até amanhecer com pequenos abalos.
Acordei pelas oito horas da manhã e finalmente consegui telefonar e veio a ordem para sumir dali no primeiro avião para qualquer lugar e fui atrás disso e já tranquilizando a todos incluindo a família que eu estava são e salvo.
Consegui um vôo na Panam e me colocaram na primeira classe de um avião lotado que voava para Miami, USA.
A decolagem daquele avião foi como um alívio imenso deixando aquele solo assustador de um país muito interessante com seus macacos atiradores de côco e aquele café da manhã que reside em meu pensamento até os dias de hoje, e o povo inesquecível de tão educado e prestativo.
Um registro muito importante nesta atribulada viagem foi ouvir por muitas vezes uma música da banda Little River Band (banda australiana) “Take It Easy On Me” contida em uma fita k-7, é, nesta época ainda era fita k-7 embora o CD já existisse tentando substituir o disco de vinil, esta música está incrustada em meu cérebro até hoje, e tem um significado imenso em minha vida.
É interessante a vida e ela passa a ser mais interessante e valiosa após passarmos uma espécie de perigo como este que relato neste artigo, e as coisas importantes junto com coincidências não param por aí. Numa certa ocasião no Estado do Mississippi, num cassino em Biloxi (cidade deste Estado), ao adentrar no local estava tocando uma música também do Little River Band, “Reminiscing” (tradução direta=reminiscências), música que sempre que ouço me lembro da cena de está entrando naquele cassino, o qual não me lembro o nome.
“Ces La Vie”
Antonio Cesar








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